Nota do Editor - OFFMIDIA tem a honra de publicar neste final de tarde de sábado o que espera ser o primeiro de uma série de textos do escritor, jornalista e roteirista Antonio Fernando Borges. Admirado por um número crescente de leitores, este carioca já premiado por “Que fim levou Brodie” (Record) acaba de lançar “Braz, Quincas & Cia”, seu mais novo roman-ce, editado pela Companhia das Letras. Ele agora está ao lado dos nossos colaboradores fixos nesta imensa tarefa que é a de revelar o tamanho da mistificação esquerdista do nosso tempo. Portanto, leitores, Borges é obrigatório.
Antonio Fernando Borges - Quando concedeu o Nobel de Literatura ao indo-caribenho V. S. Naipaul em 2001, a Academia Sueca foi acusada pela mídia de haver cedido a pressões políticas, fazendo uma escolha “ideológica” – como se Naipaul fosse ape-nas um orientalzinho de plantão, em meio àquela conjuntura marcada pelo então recentíssimo ataque criminoso ao WTC.
A acusação, diversionista, encobria uma dupla verdade: que Naipaul é de fato um grande escritor, finalmente premiado depois de anos e anos de escolhas – estas sim – ostensivamente ideológicas. As reclamações contra Naipal decorriam de seu imperdoável pecado de ser um conservador – ou, como a mídia adora rotular, um intelectual “de direita”.
Este ano, para evitar novos constrangimentos e “simplificar as coisas”, o húngaro Imre Kertész, o premiado da vez, já chegou apresentado como “um judeu vítima do Holocaus-to”. Mas basta prestar um pouco mais de atenção a qualquer de suas entrevistas para se per-ceber que não é bem assim.
É o que acontece neste sábado no caderno “Prosa & Verso” do Globo. Se outros méritos não tiver, a entrevista à correspondente Graça Magalhães-Ruether permite que Kertész fale. E então ficamos sabendo que, mais traumáticos do que a infância num campo de concen-tração nazista, foram os mais de 40 anos vividos sob o regime comunista na Hungria.
“Era impossível alguém pensar em fazer uma carreira escrevendo livremente”, Kertész comenta logo de saída, acrescentando que seus livros foram banidos das prateleiras de seu país, “porque eu não pertencia à nomenclatura comunista”.
“Durante 40 anos eu não tive um passaporte”, denuncia o escritor, que faz questão de ir muito além da já corriqueira crítica ao stalinismo (que muita gente de esquerda faz, para poder resguardar “o resto”). Acertando na mosca, Kertész diz que as ditaduras tornam as pessoas infantis, porque “roubam suas individualidades”. E acrescenta ainda que, para ele, “a pior épo-ca foi a de Brejnev, porque foi uma era de estagnação”.
Só falta agora descobrirem que Kertész – como Naipaul – escreve bem. Então, coitado, logo a mídia vai cair de pau sobre ele.